quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

O FEUDALISMO

Houve um tempo, em que os camponeses se submetiam sem questionamento à autoridade indiscriminada do senhor da terra.
Houve um tempo...E este tempo ainda sobrevive em muitas regiões do Brasil, da América e de outros lugares do mundo.

O feudalismo foi um sistema político, econômico e social que predominou na Europa Ocidental, do século IX ao XI. Suas origens encontram-se na crise do Império Romano, a partir do século III, quando ocorreu um processo de ruralização que marcou a vida européia.
Essa crise provocou o aumento do poder dos grandes proprietários de terra, uma vez que foram eles que garantiram a proteção às pessoas que saíam das cidades para o campo, proteção que o Estado romano não conseguia mais proporcionar.
A ruralização foi resultado de uma série de fatores: as guerras contra os bárbaros, que fizeram o comércio e a vida urbana declinarem; os ataques constantes dos árabes nas cidades litorâneas da Europa, empurrando sua população para o interior do continente (séculoVIII); o desmembramento do Império Carolíngio que enfraqueceu o poder real e fortaleceu os poderes dos senhores de terra; as invasões dos normandos e dos húngaros (século IX), que aumentaram o clima de insegurança na Europa e obrigaram os senhores a organizar a defesa de suas terras, o que lhes deu mais poder político.

Os húngaros, originários da Ásia, realizaram vários ataques ao Ocidente e criaram um reino na Europa Central.Os normandos também são chamados de vikings, isto é, homens das baías, porque provêm dos fiordes da península Escandinava. Usavam o drakkar, um navio de guerra que tinha um casco que acabava em chifres e cabeças de dragão e sua arma preferida era a acha. Usavam escudos circulares feitos de madeira forrada de couro e com a ponta de cobre. Sua religião era igual à dos visigodos, acreditando, também, que os que morriam em combate iam para o Valhala, o paraíso. Saquearam vários portos da Europa Ocidental e estabeleceram-se na Inglaterra e norte da França, na região da Normandia.

Assim, ao longo dos séculos, a população do ocidente europeu deixou de viver numa sociedade comercial e urbana e passou a viver numa sociedade rural e agrária, na qual o poder político era descentralizado.
A esse novo sistema de vida deu-se o nome de feudalismo.
O sistema feudal consolidou-se no século IX e evoluiu de modo diferente na Europa Ocidental.

O FEUDO, A GRANDE PROPRIEDADE RURAL

No feudalismo, em geral, a palavra “feudo” significava a posse de uma grande propriedade rural, onde se desenvolvia a vida social, econômica e política. O feudo era formado pelo castelo fortificado, aldeia, terras para o cultivo, bosques e pântanos.
O castelo, residência do senhor feudal, geralmente localizava-se num ponto que possibilitasse o controle da região: um rochedo, uma ilha, um cruzamento de estradas. Continha tudo o que era necessário aos seus moradores. Além dos cômodos da família possuía também despensa para estocar alimentos, capela, celeiros, oficinas artesanais, moinho, depósito de armas e combustíveis.
Inicialmente, os castelos eram feitos de madeira, mas a partir do século XII, surgiram os de pedra. Ao seu redor havia uma muralha e um fosso que podia ser ultrapassado por uma ponte levadiça.
A aldeia, localizada próximo ao castelo, era o local onde viviam os camponeses, em casas feitas de varas trançadas e barro, cobertas de folhas. A maioria das casas tinha apenas um cômodo e quase nenhum móvel. Uma caixa de madeira cheia de palha era a única cama para toda a família. Os camponeses alimentavam-se de pão preto, verdura, sopa e, muito raramente, comiam carne. Se as colheitas fossem ruins, passavam fome, pois tudo o que produziam era entregue ao senhor feudal.

“A fome também era causada pelos baixos rendimentos do trabalho agrícola, pois os instrumentos usados para lavrar a terra eram rudimentares e, em sua maior parte, de madeira. O ferro era tão raro e valioso que o simples roubo de uma faca era punido rigorosamente. Daí a importância dos trabalhos manuais. Por isso, quando alguém diz hoje que naquele tempo o que importava era possuir terras, está se esquecendo de que isso só tinha valor de fato porque vinha junto o poder sobre os homens e seus grosseiros instrumentos agrícolas. “Fome – O Feudalismo, Paulo Miceli”.

As terras do feudo estavam divididas em terras do senhor (manso senhorial), cultivadas pelos camponeses, cuja produção destinava-se ao sustento da família do proprietário; terras dos servos (manso servil), divididas em lotes arrendados aos camponeses, de onde tiravam uma parte da produção para a sua subsistência e de sua família, entregando a outra para o senhor; e terras comunais, constituídas por florestas, pastos, bosques e pântanos. Estas podiam ser usadas tanto pelo senhor como pelos camponeses; ofereciam pastagens para o gado, madeira para construção e fabricação de carvão e animais de caça, sendo o direito à caça reservado apenas aos nobres.


UMA SOCIEDADE ESTAMENTAL

Os estamentos fundamentam-se na origem e na função das pessoas. Numa sociedade estamental as posições sociais são rígidas, ou seja, é muito difícil uma pessoa mudar de um estamento para outro. A sociedade feudal estava dividida em três estamentos: a nobreza, o clero e os camponeses.
Segundo a tradição religiosa da época, cada estamento possuía uma missão ou função na sociedade feudal: o estamento dos nobres tinha a função de lutar nas guerras; o do clero, rezar e salvar a alma dos homens, e o dos camponeses, trabalhar, produzindo o necessário para o sustento de todos.


OS QUE GUERREIAM

A nobreza, descendente dos proprietários romanos e militares germanos, constituía o estamento dominante. Os nobres que tinham o poder sobre a terra e sobre as pessoas que nela viviam eram chamados de senhores feudais. Eram eles que administravam a justiça, criavam e cobravam impostos, cunhavam moedas, faziam a guerra e a paz.
As guerras constantes entre os senhores feudais pela disputa de terras geravam muita insegurança, obrigando os nobres a buscarem proteção nas relações pessoais. Criavam laços de dependência entre si, onde um oferecia proteção e o outro, serviços. Essas relações foram chamadas de relações feudo-vassálicas ou de suserania e vassalagem.
Aquele que doava o feudo denominava-se suserano, e o que recebia era o vassalo. O suserano assumia a obrigação de dar proteção militar ao vassalo, e este por sua vez, assumia o compromisso de ser fiel, prestar serviço militar e dar ajuda financeira quando o suserano necessitasse. Comprometia-se também a resgatá-la caso caísse prisioneiro e a contribuir com recursos para o casamento de sua primeira filha e para a armação de cavaleiro do primeiro filho.
A relação de suserania e vassalagem originou uma hierarquia. Os vassalos diretos do rei eram os condes, duques e marqueses. Esses dividiam suas terras e se tornavam suseranos de barões e viscondes, que também podiam doar feudo aos cavaleiros. Últimos dessa hierarquia, os cavaleiros, em geral, não podiam dividir suas terras, sendo apenas vassalos.
A relação de vassalagem se concretizava através de um ritual: a homenagem, o juramento de fidelidade e a investidura. O futuro vassalo prestava homenagem colocando suas mãos unidas entre as mão do suserano, num ato de entrega. Em seguida, em pé, com as mãos sobre a Bíblia ou sobre um relicário, fazia o juramento de fidelidade, e os dois se beijavam na boca para mostrar que se consideram iguais. Finalmente a investidura era feita quando o senhor entregava ao vassalo um objeto que poderia ser um ramo de folhas ou um punhado de terra, simbolizando o feudo (título, cargo ou terra).

A relação de fidelidade que ligava o vassalo ao suserano baseou-se numa instituição germânica chamada comitatus. Era comum o juramento de fidelidade entre os guerreiros germanos e seus chefes.
A prática de doação de terras teve origem no Império Carolíngio. Os reis desse império, necessitando de ajuda militar, costumava doar terras aos seus guerreiros. Era uma instituição chamada benefício.

Inicialmente, cavaleiro era aquele que combatia a cavalo e oferecia, em troca de favores, seus serviços aos nobres. Por volta do século IX, a prestação de serviço a cavalo se tornou necessária e muito dispendiosa. Por isso, para ser cavaleiro era preciso ser de origem nobre e ter riqueza para possuir armadura, armas, cavalos e ajudante.
Com o tempo, as exigências foram aumentando: o cavaleiro deveria ter uma educação especial, que começava na infância. Aos sete anos era pajem, e aprendia boas maneiras, canto, música e ouvia histórias de heroísmo. Aos 14 anos, tornava-se escudeiro, e aprendia a montar, caçar e manejar armas, e, aos 20, era armado cavaleiro.
A partir do século XIII, a Igreja interferiu na cavalaria com o objetivo de controlar a agressividade dos nobres. Foram introduzidos elementos religiosos na cerimônia de armação de cavaleiro. Assim, antes de receber as armas, o cavaleiro passava uma noite em jejum e orações. Depois, fazia um juramento prometendo: acreditar em todos os ensinamentos da Igreja e observar os seus mandamentos e suas leis; proteger a Igreja, proteger e defender os fracos; amar o seu país; lutar contra os infiéis; cumprir todos os deveres de vassalagem, desde que não fossem contrários à Lei de Deus; nunca mentir e ser sempre fiel à palavra empenhada; ser generoso com todos; ser sempre e em todo lugar defensor do Direito e da Lei contra a injustiça e o mal. No século XIV, a cavalaria entrou em decadência quando surgiram os soldados profissionais.

O espírito belisco da nobreza se manifesta também nos seus divertimentos preferidos: o torneio e a caça. Os torneios eram batalhas simuladas, usadas tanto como treinamento para a guerra, como espetáculo em que os nobres exibiam sua coragem.


OS QUE REZAM

Outro estamento privilegiado era o clero, que se dedicava à oração e à pregação. Em princípio, era aberto, porque admitia a entrada de qualquer homem livre. No entanto, a maioria do clero tinha a mesma origem que a nobreza, sendo comum filhos de nobres que não tinham ferança entrarem para a vida religiosa.
No período das invasões bárbaras, a Igreja foi a única instituição que sobreviveu organizada. Além de cuidar da evangelização dos bárbaros germânicos, conservou os documentos da cultura clássica. Exercia grande influência sobre os nobres e camponeses, impondo suas idéias e seus princípios morais.
Muitos reis e nobres, precisando do apoio da Igreja, doaram-lhe terras, o que a tornou grande proprietária de feudos. Bispos e abades, que constituíam o alto clero, governavam esses feudos como verdadeiros senhores feudais.
A Igreja desempenhou um papel importante junto à nobreza, combatendo seu espírito belicoso, por meio de instituições como a “Paz de Deus”, que proibia o ataque aos mercadores, camponeses e clero, e a “Trégua de Deus”, que condenava a guerra de sexta-feira à tarde até segunda-feira pela manhã, em honra da Paixão de Cristo.

OS QUE TRABALHAM

O estamento não-privilegiado era formado pelos camponeses, que garantiam a sobrevivência de toda a sociedade feudal. Eram descendentes de antigos colonos romanos, de escravos ou pequenos proprietários. Estavam divididos em duas categorias: servos e vilões.
Os servos, maioria dos camponeses, estavam presos à terra do senhor feudal e deveriam a ele várias obrigações. O servo era obrigado a trabalhar de graça, dois ou três dias da semana, na terra do senhor ou na construção de estradas, pontes, etc. Essa obrigação era a corvéia. Além disso, era obrigado a entregar parte da produção de seu lote ao senhor, imposto chamado talha. Se usasse o moinho, forno ou qualquer outra instalação de feudo, pagava as banalidades. Havia também a taxa de casamento, para se casar com uma mulher de outro feudo. A capitação era mais um imposto que devia ao senhor por membro da família (por cabeça).
Os vilões eram camponeses livres, pois podiam trabalhar em qualquer feudo, sendo suas obrigações definidas por um contrato de trabalho. Pagavam talha, corvéia e as banalidades.

TERRA, ÚNICA FONTE DE RIQUEZA

A economia feudal era agrária e auto-suficiente. A terra era a principal riqueza e cada feudo produzia tudo o que era necessáo para a sobrevivência de seus habitantes. O comércio reduzia-se a pequenas trocas diretas, realizadas semanalmente nas vilas.
As técnicas de cultivo eram rudimentares e, para evitar o esgotamento do solo, adotavam o rodízio das culturas. A área de cultivo era dividida em três campos. Durante o ano, enquanto dois campos eram plantados, o terceiro ficava em repouso, para aumentar a sua produtividade; nos dois campos cultivados fazia-se o rodízio do produto. Observe o esquema:

Cada um dos três campos era dividido em faixas, sendo uma do senhor e as outras arrendadas aos servos e vilões.
Além da agricultura, os camponeses criavam suínos e bovinos, aves e abelhas, das quais aproveitavam o mel, usado para adoçar os alimentos.


QUEM TEM TERRA, GOVERNA

No feudalismo, tinha poder quem tivesse terra, e o poder sobre ela significava também poder sobre as pessoas. Esse poder estava nas mãos do senhor feudal, que era soberano em sua propriedade e exercia nela funções de estado: tinha exército, moeda e tribunais próprios. O rei era um senhor feudal como os outros nobres e dependia do apoio militar da nobreza para enfrentar os inimigos. Portanto, o poder político, no feudalismo, era descentralizado.